Angelo Poletto Mendes/Redação JC
O desastre climático que devastou a capital gaúcha, cidades vizinhas e grande parte do Rio Grande do Sul, deixando um gigantesco rastro de prejuízos humanitários, estruturais e econômicos – cujo custo será bancado por todos os brasileiros por meio da injeção de vultosos recursos públicos para mitigar a tragédia -, serve também como alerta para Florianópolis e grandes cidades catarinenses sobre a importância de se considerar a emergência climática na elaboração das políticas públicas.
Às vésperas de conhecer os efeitos práticos do novo e polêmico plano diretor da cidade, aprovado no ano passado sob protesto de segmentos comunitários e populares , que abre caminho à expansão predial ainda mais acelerada e à verticalização dos balneários – com potencial de agravar a impermeabilização do solo -, a capital catarinense sabidamente não é imune a eventos extremos. Nos últimos 10 anos, pelo menos uma ou duas enxurradas por ano, em média, castigaram a cidade e a população, causando grandes transtornos e prejuízos; sem falar nos eventos atípicos, como os ciclones.
Segundo levantamento divulgado pela UFSC há pouco mais de um ano, Santa Catarina teve que injetar quase R$ 32 bilhões para mitigar desastres naturais nos últimos 30 anos. Entre 1991 e 2021, conforme o estudo, foram mais de 6,5 mil ocorrências ao longo do estado, implicando em mais de 16 milhões de pessoas afetadas. Santa Catarina encabeçaria inclusive a lista dos estados brasileiros mais suscetíveis a eventos climáticos extremos.
“Florianópolis não possui até hoje um plano de macrodrenagem; com o aquecimento global, o aumento dos oceanos e a ocupação acelerada, a cidade corre sério risco de colapsar se não se preservarem as áreas alagáveis do município”, sustenta Eugênio Luiz Gonçalves, membro do Conselho Municipal de Saneamento. “Vemos com muita preocupação esse novo cenário ambienta, agravado pela vigência do novo plano diretor, que franqueia a verticalização em ruas com infraestrutura precária”, faz coro a presidente da Associação de Moradores do Campeche, Roseane Panini.
É consenso que a tragédia gaúcha, que pode levar o Rio Grande do Sul a um longo período de ostracismo econômico e social, não deveu-se apenas ao rigor da intempérie climática. Teve muito a ver também com prioridades no âmbito dos governos de Porto Alegre e do estado, que negligenciaram efeitos vinculantes das políticas públicas e decisões gerenciais. Além da supressão de inúmeros salvaguardas ambientais, no âmbito estadual, ficou evidenciado também o sucateamento da estrutura de mitigação da cheias na capital gaúcha. O único aspecto positivo do drama riograndense, se é que se pode dizer assim, foi catapultar a questão ambiental de volta ao topo da agenda política. Na foto, situação da capital gaúcha em 05.05.2024.
(Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República/Divulgação/Arquivo/JC)