Angelo Poletto Mendes/Redação JC
A recente retomada do processo de elaboração do plano diretor da capital, implementada pela Prefeitura a partir de determinação judicial, põem em risco o principal ganho obtido pelas comunidades do Sul da Ilha no polêmico plano diretor sancionado em 2014, que foi a restrição à verticalização predial da região.
Embora transformado numa chamada ‘colcha de retalhos’ após a introdução de centenas de emendas pela Câmara de Vereadores e mesmo oriundas do próprio governo municipal, o projeto manteve a restrição à expansão construtiva, considerada pelos movimentos comunitários locais como um dos pilares para a sustentabilidade da região. Reiteradas vezes, moradores do Campeche foram às ruas contestar a flexibilização predial na região, inclusive uma inacreditável e nefasta proposta de se permitir até 12 andares na planície há alguns anos (foto).
O delegado distrital do Campeche no Núcleo Gestor Municipal, Ataíde Silva, considera positiva a rediscussão do plano, porque possibilita a correção de uma série de alterações no projeto original concebido pelas comunidades, nos âmbitos ambiental e viário, mas alerta para o risco latente de novas pressões pela liberalização predial na região. “Precisamos estar atentos para fiscalizar de o voto dos nossos vereadores”, afirmou.
Além da manutenção dos gabaritos construtivos, fixados em dois pavimentos em toda a Planície do Campeche, Silva ressalta como essencial corrigir distorções no sistema viário previsto no texto de 2014, entre elas a introdução de vias agressivas na região, com até 35 a 40 metros de largura. “Esse tipo de via é uma pegadinha para verticalizar, porque mais tarde é só a Câmara alterar o zoneamento”, argumentou.
A preocupação é corroborada pelo delegado distrital do Pântano do Sul, Gert Schinke, que salienta como agravante a perigosa confluência de datas entre as definições sobre o plano diretor e as novas eleições municipais. “Essas discussões já deveriam ter sido iniciadas pelo menos um mês antes, mas fomos foto vencido na definição do cronograma no Núcleo Gestor”, assinalou.
O grande temor das lideranças comunitárias é de que o projeto possa ser votado a toque-de-caixa pela Câmara de Vereadores em pleno período eleitoral, quando muitos ficam suscetíveis aos tradicionais financiadores de campanha. A possível transferência da votação do novo plano para após o pleito, por sua vez, pode levar os ‘não reeleitos’ a votarem descomprometidos. Existe ainda o risco da apreciação ficar para a nova legislatura, a partir de janeiro de 2017.
O próprio vereador oposicionista Lino Bragança Peres (PT) considera pertinente a preocupação com uma possível nova pressão econômica para alterar diretrizes urbanas fixadas pela comunidade. “Existe sempre o risco de que as comunidades sejam usadas como mera fachada homologatória”, comentou. O dirigente lembra que só do ano passado para cá já teriam sido liberados 180 mil metros quadrados de novas construções no Campeche e região por meio de decreto.
Audiência final está prevista para agosto
Com duas audiências públicas realizadas no Sul da Ilha no final de maio, no Campeche e Armação, a Prefeitura deu a largada à retomada das discussões do plano diretor da capital, visando a concepção de um novo projeto de política urbana para a capital. A iniciativa atende determinação judicial, que considerou ilegal o rito utilizado para elaboração e sanção do plano aprovado pelo governo municipal em 2014, por restringir a participação popular.
A Prefeitura fixou um calendário de rediscussão que contempla a realização de 13 audiências distritais até o final de junho, a última delas prevista para 29/06 no Ribeirão da Ilha, uma audiência geral e outras duas finais, estando a derradeira programada para 18/08, menos de dois meses antes das eleições. As duas primeiras audiências, no Campeche e Armação, respectivamente, reuniram quase 500 pessoas.
Presente a ambas, o delegado distrital do Pântano do Sul, Gert Schinke, considerou os eventos muito positivos. Ambas deixaram explícitas, através de intervenções e discursos, do amplo apoio da maioria às diretrizes fixadas pelas comunidades. Na audiência da Armação, o projeto comunitário teve até aprovação em votação simbólica dos 130 presentes. Todas as audiências, no entanto, tem caráter meramente consultivo.
A assessoria do Instituto de Planejamento Urbano da capital (IPUF), que coordena a realização das audiências, informou que as atas destes encontros serão transformadas posteriormente em relatórios com divulgação pública. Em relação às duas primeiras, no Sul da Ilha, a previsão é de que o documento fique pronto até meados de junho.
(Foto: Willi Heisterkamp/Divulgação/Arquivo/JC)