Angelo Poletto Mendes/Redação JC
Uma das mais emblemáticas edificações da capital catarinense acaba de completar seis décadas de existência. Instalada no alto do Morro das Pedras, de onde se descortina uma das mais impressionantes vistas panorâmicas da Ilha de Santa Catarina, a Casa de Retiros Vila Fátima, conhecida popularmente por casa de pedra ou, para os mais antigos, convento das freiras, em alusão às irmãs franciscanas e da Divina Providência que ali habitaram até os anos 70, até hoje fascina moradores e turistas.
Por conta de suas características construtivas únicas, toda edificada em enormes cabeças de pedra, localização privilegiada e a vastidão de natureza e silêncio que a envolve, a casa de pedra até hoje preserva uma aura de mistério e permanece cercada de enigmas. O mais intrigante é, sem dúvida, a complicada operação que teria sido necessária para deslocar até o alto do morro milhares de pedras, a lapidação e o encaixe perfeito das peças na estrutura.
Inaugurada em 1956, numa época em que os acessos ao Sul da Ilha ainda eram muito rudimentares, a edificação levou em torno de cinco anos para ficar pronta, envolvendo 42 operários, todos oriundos de italianos trazidos de Nova Trento. Um dos últimos remanescentes vivos desse período, homenageado durante as recentes cerimônias de aniversário, o pedreiro José Lino Meurer, atualmente com 90 anos, conta que boa parte das pedras teria sido gerada no próprio local, através de explosões com dinamite.
Em 2003, em entrevista ao repórter deste jornal, outro operário da obra, Virgílio Cadorin, então com 71 anos, disse que grande parte das pedras era trazida em caminhões e depois tinha que ser puxada por sete metros. Pesando cada uma delas em torno de 80 quilos, envolvia dois homens na tarefa. Outra dificuldade era a inexistência de betoneiras, com a argamassa tendo que ser feita literalmente no muque. A primeira pedra da edificação, conforme relato de Cadorin, teria sido assentada em 1951.
A mística que envolve a casa, fundada e até hoje mantida pela Companhia de Jesus – também conhecida por Congregação dos Jesuítas, mantenedora do tradicional Colégio Catarinense na capital, conhecida escola da classe média alta e elite florianopolitana -, deve-se em muito também ao isolamento que manteve durante as primeiras décadas. Uma parte habitada por jesuítas e outras pelas freiras, que permaneceram ali até os anos 70, a casa era restrita para retiros de católicos. Somente em meados dos anos 70 se abriu à visitação de religiosos de correntes não católicas. Na última década, a casa intensificou essa abertura, passando a aceitar também outras doutrinas religiosas e filosóficas, budistas, kardecistas e outras. Atualmente, hospeda até mesmo famílias não religiosas, e ainda disponibiliza espaço para realização de diversos tipos de eventos.
Casa recebe 10 mil visitantes por ano
Quem observa a casa de pedra por fora pode suspeitar que por dentro contemple ambientes sombrios, portas rangentes e silêncios retumbantes. A realidade, contudo, é bastante diferente. Dotada de 30 apartamentos arejados, dotados de wireless, que podem abrigar até quatro pessoas cada, ampla e arejada cozinha de paredes azulejadas, refeitório com capacidade para até 100 pessoas, varandas, sacadas, jardins, trilhas e uma linda capela, oferece conforto similar ao de grandes hotéis.
Graças a sua localização privilegiada e o clima de serenidade que a cerca, a casa tem sido cada vez mais procurada para realização de eventos corporativos, palestras, seminários e treinamentos, e também férias familiares, além dos tradicionais retiros de meditação e contemplação de caráter religioso. A casa já foi cenário até mesmo de uma novela da Rede Globo, reunindo elenco estelar no local, entre eles Antônio Fagundes, Fábio Assunção e Paola de Oliveira. A captação de eventos e hóspedes se dá exclusivamente por meio de telefone ou através da internet, não havendo atendimento ao público diretamente no local.
Segundo a coordenadora Ednéia Romão, a casa de retiros recebe anualmente cerca de 10 mil pessoas, entre retirantes, cursistas e hóspedes, sem falar nas milhares de pessoas que visitam suas dependências externas para apreciar a espetacular paisagem, que abarca grande parte da costa sul da Ilha de Santa Catarina. O acesso para visitantes externos, que até há alguns anos era livre a qualquer horário, hoje abre somente das nove às 18 horas. “Foi uma medida de segurança e também para preservar a serenidade do local”, explica Ednéia.
(Foto: Willi Heisterkamp/Divulgação/Arquivo/JC)