A palavra dieta, do grego díaita, quer dizer “modo de viver”. Ela refere-se a algo além da escolha alimentar. A consciência do que se coloca no prato ou se traz para a cozinha acompanha os veganos, mas essa preocupação não se volta aos interesses pessoais deles. As pessoas tornam-se veganas por causa da consciência do sofrimento dos animais confinados e abatidos no sistema industrial de produção de carne, leite, ovos, mel, vestuário, lazer, etc. Ser vegano implica investigar o processo de produção de tudo o que lhe é oferecido para uso e consumo, e abolir a compra de qualquer produto que contém derivado animal. Não importa se esse derivado é tirado do animal vivo, ou produzido depois de o animal ser morto. O modo de vida vegano tem uma característica de “radicalidade”, no sentido de coerência ética. Veganos perguntam nas lanchonetes e restaurantes o que está escondido em cada item do cardápio, por exemplo, se contém mel, manteiga, queijo, creme de leite, leite, ovos, gelatina, caldo de carne e carnes. Algumas pessoas acham que são obsessivos, para não usar termos por vezes pronunciados com hostilidade contra os veganos. Uma vez compreendido o sentido ético de não causar mal a nenhum animal para obter vantagens para si, não é possível ao vegano poupar certos animais e condenar outros ao sofrimento. A liberdade física, a vida e o bem-estar dos animais é algo que merece respeito, sem discriminação especista. Essa coerência acompanha os que decidem traçar sua biografia no parâmetro da não-violência contra os animais. Por isso, a dieta vegana requer coerência na adoção do princípio da não-violência. No entanto, os veganos vivem e consomem na mesma realidade na qual vivem e consomem os onívoros e os vegetarianos ou vegetusianos, os que se alimentam dando preferência a produtos de origem vegetal, mas admitem consumir os de origem animal, carnes de todo tipo, laticínios, mel e ovos, lazer e diversões que usam animais, etc. Onívoros e vegetarianos não são hostilizados pelo mercado da alimentação. Veganos são. A maior parte dos donos de restaurantes, e das pessoas que atendem e servem o público, desconhece o significado da palavra vegano: que não ingere nada que contenha qualquer ingrediente de origem animal. As comidas oferecidas contém ingredientes de origem animal. Tortas veganas são servidas em raríssimos lugares. O termo vegan foi criado em 1944 por Donald Watson e um pequeno grupo de ingleses que estavam cansados de explicar que eram “vegetarianos estritos”, “vegetarianos radicais”, isto é, não consumiam nada de origem animal. Dar tal explicação, para obter uma comida inteiramente vegetal (grãos, cereais, leguminosas, verduras, hortaliças, frutas, oleaginosas, etc.), era necessário, porque os que se dizem vegetarianos, isso continua até hoje, comem muita coisa que não é de origem vegetal. A pessoa deixa de comer carne e usa logo o termo vegetariana para se autodesignar. Quase todos os que hoje são veganos, isto é, aboliram todo e qualquer alimento de origem animal, passaram por essa etapa da abolição da carne e da autodesignação “vegetariano”. Então temos essa confusão na cabeça das pessoas. Alguém se diz vegetariano, mas come leite, queijo, ovos, peixe, “frutos do mar”, como se fossem de origem vegetal. Aborrecidos por serem servidos com comidas que continham derivados de leite e ovos, os “vegetarianos estritos” criaram o termo vegan para deixar claro que não seguiam a dieta vegetariana padrão. Assim nasceu o termo, em Londres, usado no Brasil, desde 2003, com a desinência portuguesa, vegano, vegana. A dieta vegana não se restringe ao conteúdo do prato ou dos lanches e petiscos. Produtos de higiene pessoal, de limpeza, cosméticos, acessórios, vestuário, lazer e diversões, além de medicamentos, entram no rol da proposta abolicionista defendida pelos veganos. Os humanos tem suficiente tecnologia para produzir roupas, sapatos, enfeites e produtos de uso diário, além do lazer e divertimentos, sem matar ou torturar animais no processo de produção. Por isso, o modo de viver vegano é uma proposta abolicionista de libertação dos animais do atual sistema de produção de bens e serviços voltados ao consumo humano. (Sônia T. Felipe, professora universitária e vegana)
16 de dezembro de 2009