27 de fevereiro de 2008

Adrenalina move grupo do Sul rumo a trilhas do interior

Comissário de Polícia Civil, Valdir Effting, de 47 anos, precisa lidar todos os dias com a questão do crime e da violência na capital. Para relaxar e deixar as preocupações de lado, em média de duas em duas semanas Effting passa horas rodando em meio a pedras, aclives, buracos, lama, água e chuva. Só que, paradoxalmente, neste caso trata-se de uma diversão, que gera adrenalina sem o estresse da investigação criminal. O comissário é integrante do grupo Gaioleiros da Ilha, que reúne 11 membros efetivos, a maioria moradores do Campeche, numa mistura de esporte e confraternização, percorrendo trilhas em meio a paisagens naturais exuberantes a bordo das “gaiolas”, os famosos carros usados em enduros com carrocerias baseadas em armações de metal. Para o policial, é exatamente esse aspecto do desafio e vencer obstáculos que torna a prática uma válvula de escape para esquecer os problemas do dia-a-dia. Os gaioleiros geralmente percorrem as trilhas aos sábados e chegam a atravessar mais de 40 quilômetros ao longo de um dia inteiro, mas sem conflitos ou competição. Effting garante que há muitos lugares difíceis e que ficar com o carro atolado ou estragar alguma peça são ocorrências comuns. Cada gaioleiro costuma levar um acompanhante que ajuda nessas horas, empurrando a gaiola e ajudando a consertar o defeito. Os ajudantes não são navegadores, pois os membros do clube não usam mapas. Há vários caminhos que os participantes já percorreram várias vezes e conhecem, mas muitos são visitados pela primeira vez. “Todo mês procuramos um trajeto bem difícil”, afirma. As trilhas mais visitadas pelos gaioleiros ficam em Palhoça e São Pedro de Alcântara, na Grande Florianópolis. O comissário de polícia lembra que, durante as viagens, também se formam muitas amizades e os gaioleiros mantêm contato fora dos dias de percorrer trilhas. Os participantes levam artigos como carne e cerveja, e costumam improvisar churrascos no meio do mato. “Todo mundo se conhece e é um pessoal saudável, ninguém usa drogas, essas coisas”, comenta. Ele conta que seu filho de 14 anos ficou sabendo do clube na Internet e ficou muito entusiasmado, passando a ir com o pai às trilhas. O comissário de polícia comprou sua gaiola já pronta de outro participante e avalia que um bom modelo custa na faixa entre R$ 3 mil e R$ 4 mil. Como os veículos não têm licença para transitar nas ruas e estradas, precisam ser transportados de caminhão ao local. Já o mecânico Alcemir Alcemiro Bardança, de 32 anos, fez ele mesmo sua gaiola. Conta que basta um motor e chassi de Fusca, Gol ou Parati, canos de ferro e um jogo de pneus. O mecânico diz que leva cerca de dois meses para construir e ressalta que ser que ser mecânico é, literalmente, uma mão na roda nos momentos em que há uma quebra. Alcemir lembra que, embora não seja caro montar o veículo, há muito gasto com manutenção por causa das constantes quebras. Ressalta ainda, por outro lado, que embora as viagens sejam fisicamente cansativas, ajudam muito a combater o estresse. “Nunca tivemos alguém machucado”, assegura. O mecânico também diz que ninguém fica preso quando as gaiolas atolam porque um veículo 4X4 acompanha o grupo nas trilhas. O grupo existe há três anos e conta com um site próprio (www.gaioleirosdailha.com.br). O caminhoneiro Antônio Machado, de 30 anos, que também participa do Gaioleiros, já faz gaiolas e anda em trilhas há cinco anos. “Parte da graça é construir e ver o que você fez dando certo”, diz. Para ele, andar em gaiolas dá uma sensação de liberdade e ao mesmo tempo de ultrapassar obstáculos. (Texto: Alexandre Winck/Especial/JC – Foto: Luís Prates/Divulgação/JC)